RESUMO
Nesta obra discute-se o conceito de autenticidade como predicado de execuções de obras musicais no contexto da tradição clássica ocidental. Defende-se que o conceito de execução (simpliciter) de uma obra levanta problemas de relatividade e de indeterminação, visto a sua aplicação não ser completamente independente de considerações de valor estético, e de aspectos dos contextos histórico-musicais relevantes. Contesta-se o argumento a favor da necessidade da autenticidade na execução musical que elimina o debate acerca da extensão do conceito “execução autêntica de uma obra” reduzindo este conceito ao de instanciação correcta dessa obra. Sugere-se que o modo como o contexto histórico-musical actual delimita as fronteiras da correcção e da autenticidade na execução decorre de um equilíbrio entre dois tipos de interesse na execução enquanto prática artística: o interesse na obra executada como produto artístico do compositor, interesse que favorece a fidelidade à obra; e o interesse na execução como produto artístico do intérprete, interesse que favorece a liberdade criativa deste. É defendida a relevância de certas obrigações morais da parte dos intérpretes para com os compositores, mas também o carácter suplantável dessas obrigações, bloqueando-se assim a tese da autenticidade histórica como imperativo ético absoluto. Distingue-se autenticidade pessoal, enquanto criatividade e sinceridade do intérprete na execução, e autenticidade histórica, enquanto fidelidade da execução à obra, ao seu compositor, ou ao som de uma execução, às práticas musicais ou à experiência estética típicos do contexto original da obra. Argumenta-se contra a tese de que a execução historicamente autêntica tem vantagens a priori sobre outras espécies de execução em termos de propensão para gerar resultados esteticamente (musicalmente) mais satisfatórios. A promoção da autenticidade histórica pelo “movimento da execução historicamente informada” é analisada enquanto ideologia e prática artística. Conclui-se que a autenticidade histórica não é um ideal artístico defensável, uma vez que a prioridade da correcção histórica na execução é, em última análise, incompatível com prioridades estéticas.
ANTÓNIO LOPES
O VALOR DE UM BACH AUTÊNTICO. UM ESTUDO SOBRE O CONCEITO DE AUTENTICIDADE NA EXECUÇÃO DE OBRAS MUSICAIS
Lisboa: Gulbenkian, 2010
Sem comentários:
Enviar um comentário